sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Das saudades

Podia ser mais fácil definir esta coisa de que tantos padecem, uma espécie de moléstia que nos ataca e que pesa no coração, nos restringe os pensamentos e nos torna pesarosos. Não é uma doença - sim, considero que o seja - qualquer, mas um enfado da alma. E para isso ainda não inventaram uma cura cientificamente testada.

Saudade é querer ter nos braços quem está longe, suspirar urgentemente pelo cheiro, querer por perto um sorriso, ansiar por um beijo. É ter insónias dolorosas, como se padecessemos de uma dor de dentes e é, no entanto, bem pior do que isso. Mezinhas e ervas medicinais não existem para curar um ataque de saudades.

Lembro-me de estar contigo, deitados lado a lado, como se o mundo fosse apenas o espaço que nos separava - quase nenhum. E lembro-me de não querer que existisse mundo e puxar-te para mais perto até respirar pelos teus cabelos escuros fora, enredar os dedos nos teus, finos e longos, de unhas brilhantes de verniz escarlate, descobrir todos os teus sinais e marcas deixadas pelo sol, querer guardar na memória cada pedaço de pele morena e o brilho dos teus olhos amendoados. Queria adormecer assim para sempre, sem a urgência do coração e do toque a pedir mais por estares longe, com o teu calor misturado no meu e a escutar a tua respiração tão leve.

Saudades é querer de volta momentos que se foram tornando lembranças, recriá-los vezes sem fim até que se transformem em doces rotinas. O teu sorriso pela manhã, ao som dos raios de sol a entrarem, abafados pelos cortinados, e depois o teu "bom dia" de voz ensonada e o não querer deixar-te sozinha, com medo que desaparecesses. Saudades são este tormento, que faz com que não te esqueça nunca, nem durante as tarefas mais corriqueiras.

Quando desapareceste quis-te tanto de volta que não dormi, quis tanto o teu calor que me enredei em cobertores em pleno verão e não lavei os lençóis até ter a certeza de que o odor que ali permanecia era apenas o meu. De vez em quando, tenho a impressão de sentir o teu aroma por aqui, trancado na parede onde te encostavas quando o sol te enfastiava de tanta quentura, ou em todos os objectos que tocaste e que eu deixei tal como estavam durante muito tempo.

Quando penso em ti, fazes-me sentir tantas saudades que não me lembro de quem sou.

Um comentário:

Tu sabes quem, disse...

gosto de ver florescer a tua escrita, ao sabor de dissabores - passo a redundância, foi intecional - e tenho pena de que assim seja. gostava de te ver escrever sobre coisas bonitas e felizes.

saudades causam-me sempre tormentos insuportáveis - passo a redundância temática, foi intencional - e é bom ver que não sou a única.

por exemplo, tenho saudades das nossas conversas e das meias de leite. não dessa forma tormentosa, claro.

cabelos escuros, dedos finos e longos, verniz escarlate, pele morena e olhos amendoados dão-me pistas sobre o objecto da tua saudade =b

beijinho lunático*